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Levedura usada na produção de cachaça pode prevenir asma, revela estudo

24 de fevereiro de 2023 às 12:57

Uma dose diária do probiótico Saccharomyces cerevisiae UFMG A-905, isolado da produção de cachaça, pode prevenir a asma, doença caracterizada pela inflamação das vias aéreas, limitação do fluxo de ar e remodelamento brônquico (consequência anatômica da inflamação nas vias aéreas). A doença afeta 334 milhões de crianças e adultos em todo o mundo.

Os dados são de um estudo feito por pesquisadores das universidades de São Paulo (USP) e Federal de Minas Gerais (UFMG) com camundongos machos. Os resultados foram publicados na revista Probiotics and Antimicrobial Proteins.

Embora tratamentos funcionais com probióticos para prevenir ou tratar diversas doenças – de pele, gastrointestinais, neurológicas e alérgicas – venham despertando maior interesse, ainda faltam, em muitos casos, estudos que definam dose e regime de administração ideais para realmente atingir os benefícios esperados.

Era o caso da S. cerevisiae UFMG A-905, levedura utilizada pela indústria alimentícia na produção não só de cachaça como também de cerveja e pão. Seu potencial para atenuar sintomas da asma em modelo animal já era conhecido, porém, mais detalhes de como aproveitá-lo eram necessários.

O novo estudo mostra que o ideal é ingerir diariamente uma dose na concentração de 109 UFC/ml (Unidades Formadoras de Colônias por mililitro da solução administrada aos roedores). Isso representa uma estimativa de 10 bilhões de bactérias viáveis por mililitro. Para se ter uma ideia, um tipo de leite fermentado tem 16 bilhões de probióticos em um frasco de 65 ml.

“É preciso entender que os probióticos funcionam como medicamentos, ou seja, não adianta tomar de vez em quando ou na dose inadequada”, explica Marcos de Carvalho Borges, professor do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP e orientador do estudo.

O trabalho avaliou, durante 27 dias consecutivos, os efeitos de uma dose diária de 100 microlitros (μL) de uma solução com o probiótico em três concentrações diferentes: 107, 108 e 109 UFC/ml. Também foi investigado o regime de dias alternados (três vezes por semana) de administração de 100 μL da solução com 109 UFC/ml de S. cerevisiae UFMG A-905 durante cinco semanas. O estudo contou com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

A avaliação foi feita em camundongos machos sensibilizados intraperitonealmente com ovalbumina (proteína da clara do ovo que induz a asma) e também desafiados com ela intranasalmente. Eles receberam a levedura diretamente no estômago por meio de um tubo.

Os autores descobriram que, em comparação a camundongos do grupo-controle, que receberam apenas solução salina, tanto a administração diária quanto em dias alternados do probiótico reduziram significativamente a hiper-responsividade brônquica, ou seja, o estreitamento exagerado das vias aéreas em resposta a um estímulo, uma das principais características da asma.

Porém, do ponto de vista da inflamação das vias aéreas propriamente dita, apenas a dose mais alta ministrada todos os dias foi capaz de reduzi-la nos camundongos asmáticos.

“Observamos o grau de inflamação pela quantidade de eosinófilos [células de defesa] e pela produção das citocinas, ambos marcadores inflamatórios da asma que se mostraram consideravelmente reduzidos”, explica Borges. “Chegamos à conclusão de que a S. cerevisiae UFMG A-905 isolada da cachaça artesanal tem um bom potencial para prevenir a doença, porém, para isso, deve ser ingerida todos os dias, em uma dose alta.”

A administração diária do probiótico em concentrações de 107 e 108 UFC/ml e em regime de dias alternados não diminuiu significativamente a inflamação das vias aéreas e pulmonares.

“Do ponto de vista de política pública, ter um produto natural como um probiótico, que praticamente não apresenta efeitos colaterais, para potencialmente prevenir o desenvolvimento de uma doença tão prevalente como a asma é muito importante”, completa Borges.

Remédio em formato ideal 

Com os estudos em animais finalizados, a ideia agora é elucidar os mecanismos envolvidos no efeito benéfico da S. cerevisiae UFMG A-905 e avaliá-la em humanos para confirmar se os mesmos resultados são reportados.

Para isso, os pesquisadores querem ir além de criar um simples comprimido com a solução e pensam em desenvolver produtos alimentícios fermentados com o probiótico.

Em outro trabalho, um mestrado orientado por Borges em parceria com a Universidade de Campinas (Unicamp) e a UFMG, já foi desenvolvido um pão com o efeito preventivo. O produto acaba de ser patenteado e deve ser reportado em breve em revistas científicas.

CNN Brasil